Tiago Hesp | “PANO CRU”
Tiago Hesp (1981), é um artista português com uma longa carreira artística multidisciplinar
que toma expressões desde a arte muralista, passando pela música, ilustração, cenografia e
pintura.
Formado em Cenografia pela Escola Superior de Teatro e Cinema de Lisboa (antigo
Conservatório de Lisboa), Tiago Hesp tem vindo a explorar múltiplas técnicas e abordagens à
sua arte, tendo ganho bastante visibilidade pelo seu trabalho em graffiti, que desenvolve
desde 1998.
Pano Cru é um reflexo do pensamento de Tiago Hesp e da sua abordagem ao mundo e à
vida em geral. Partindo do pressuposto da desconstrução enquanto processo mental de
interpretação dos estímulos que o rodeiam, o trabalho de Tiago Hesp assume muitas vezes
(mas nem sempre) a forma abstrata; sendo muito pessoal, o corpo de trabalho que aqui
vemos é porventura algum do mais “inacessível” do artista.
Tiago Hesp pinta para tentar resolver-se enquanto ser humano no mundo, numa
permanente tentativa de encontrar o equilíbrio de ter um sítio que é apenas seu.
Partindo sempre do escuro – refletido no traço negro permanente, na agressividade da sua
aplicação – as suas telas são uma tentativa de resolver e equilibrar as várias forças que o
atingem, numa batalha em que o eu e o eu se encontram e se disputam, procurando
amenizar-se num qualquer meio termo entre o negro e o alvo, procurando algo do conforto
da normalidade que encontramos nos outros.
No início do trabalho de Tiago Hesp está o medo, o medo de falhar, e dessa forma o
processo artístico de Tiago Hesp, com recurso à colagem, ao uso de diferentes camadas de
informação, bem como aqui em concreto do Pano Cru, são uma defesa; uma defesa perante
si próprio, onde o exercício de controlo do eu negro acontece recorrendo à crueza dos
materiais de forma a não eliminar o belo do eu alvo; o artista arrisca-se e o processo torna-
se gradualmente num exercício de libertação pessoal e de ordenamento de caos.
O resultado é um trabalho que nos quer entrar dentro do olho; um trabalho onde sentimos
ser possível entrar lá dentro e sentir cada linha, cada traço, cada desequilíbrio, cada cor,
mergulhando assim num universo paralelo que nos transporta para uma realidade emotiva
alternativa que nos põe em contacto direto com os “monstros” que habitam em todos nós.
Raul Carvalho
Nas palavras do artista:
Em tudo, tendemos a procurar o que nos é par, o que nos é próximo, o conforto do que é tangível pelo conhecimento adquirido. Como seres animais também; aceitamos se nos é familiar, afastamos se não compreendemos. Aceitar que o fazemos é ganhar consciência da regressão. Crescemos criando muros que julgamos ter como pilares e fechamos portas ao desconhecido. O sentir é desaprendido. Com o intelecto, calculamos. Olhando para uma pintura, facilmente aceitamos se nela nos reconhecermos, mas perdemo-nos se não a soubermos justificar.
É tão transversal à arte como o é socialmente. A necessidade do conforto de no outro nos vermos, derruba a possibilidade do oposto, de encontrar o desconhecido. Embrenhado neste pensamento, dei por mim construindo no sentido inverso, decompondo, criando caos para criar sem prisões, liberto, tentando imitar nada.
O meu trabalho vem-se desenvolvendo por via da desconstrução: da imagem, do reconhecimento, do abandono desse conforto. “O que é” interessa menos que o “fazer sentir”, sendo o sentir mais universal e puro que a muralha do senso comum. Por vezes o figurativo? Sim, por vezes. Mas muitas mais o figurativo quebrado para dar lugar a uma construção de linhas, manchas, cores. Uma que não seja de imitar. Um caos simples, feito para sentir.
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